segunda-feira, 8 de maio de 2006

traumas de guerra

Alameda. Desço as escadas. Já lá está o metro. Mas... está cheio, não há lugar nem para mais uma pessoa. Deixo-o ir. Espero pelo próximo. Só mais dois minutos. De repente oiço:

- O Salazar já morreu.

Resposta:

- O país agora está uma m*rda. E a culpa é dos pais que não sabem educar os filhos.

Isto alto e bom som. Houve mais troca de palavras, mas o cérebro não conseguiu registá-las todas. Chega o novo metro. Os ânimos acalmam. Entro. Novamente, está cheio. Lá tenho que ir em pé. Procuro onde me agarrar. Detecto um certo cheiro a álcool. Olho para o meu lado esquerdo. Sim, está lá o primeiro indivíduo. Calma. Respiro fundo. Não há-de ser nada. Olaias. Bela Vista.

- Haviam de pôr aqui uma bomba e rebentar com isto tudo.

Pausa.

- Os pretos, a culpa é toda dos pretos. Mas porque é que Deus não os mata a todos!? Seis anos. De Sol a Sol! Era acabar com eles todos!

Aqui o tal senhor começa a gesticular. Não que isso normalmente me incomode. Mas assim tão perto, não obrigada! Chelas. Ele lá continua no seu monólogo. Cada vez me encolho mais. Olivais. Boa, vou sair aqui. Saio. Subo as escadas. E agora? Queria mesmo ir ao Vasco... Desço pelas outras escadas. Um minuto para chegar o próximo metro. Olho em frente. Lá está ele outra vez. Mas desta vez, vou bem longe! Metro. Entro quase na última carruagem. Ele na primeira. Cabo Ruivo. O senhor lá continua a mostrar a sua revolta. Oriente. Saio. Vou à minha vida.

Agora reflectindo: não sei o que é passar por uma guerra, nem os traumas que daí podem vir. Será que foi assim tão necessário? Pensaram nas consequências para muitas das pessoas que para lá foram? De certeza que aquele senhor não diz mal dos "pretos" só porque um dia, numa ocasião insignificante decidiu embirrar com eles. Nem mesmo o álcool que ele possa ter bebido o justifica. Há ali muito mais. Tempos que felizmente muitos de nós não vivemos. E espero que nem viveremos!

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